O cowboy do cabo cravou uma adaga em Bob Iger, enquanto a Disney e a ESPN estão nas cordas

O cowboy do cabo atacou Bob Iger com uma adaga, enquanto a Disney e a ESPN estão em apuros

Na sexta-feira, após anos de tensões crescentes, a batalha começou, colocando a segunda maior empresa de cabo dos EUA, Charter Communications Inc., contra a gigante de mídia Walt Disney Co. À meia-noite, com os dois lados incapazes de chegar a um novo contrato de programação plurianual, os 14,7 milhões de assinantes de TV da Charter perderam acesso à ABC, ESPN e outros canais de propriedade da Disney, incluindo a cobertura do torneio de tênis US Open neste fim de semana.

Nenhum lado parece estar disposto a ceder. A ESPN recorreu às redes sociais para alertar os clientes da Charter de que a rede havia sido retirada de sua programação, oferecendo um link para obter mais informações. A Charter, que oferece serviço de TV sob a marca Spectrum em cidades como Nova York e Los Angeles, enviou seus próprios avisos aos clientes e realizou uma chamada improvisada com investidores na sexta-feira de manhã.

“Estamos à beira de um precipício”, disse o CEO da Charter, Chris Winfrey, durante a ligação. “Estamos avançando com um novo modelo de vídeo colaborativo, ou estamos seguindo em frente”.

As ações de entretenimento e de empresas de cabo despencaram. A Disney, cujos negócios incluem parques temáticos e navios de cruzeiro, teve uma queda de 2,4% no fechamento de sexta-feira em Nova York. A Warner Bros. Discovery Inc. caiu 12% e a Paramount Global, controladora da CBS, caiu 10%. A Charter caiu 3,6% e a Comcast Corp., a principal provedora de cabo, declinou 2,2%.

Segundo a Bloomberg Intelligence, a Disney pode perder cerca de US$ 4 bilhões em receita, incluindo taxas de distribuição e publicidade. No entanto, segundo analistas da Lightshed Partners LLC, as apostas podem ser ainda maiores para a indústria de mídia e TV paga como um todo, chamando isso de “momento decisivo”.

Winfrey viu isso chegando. Há sete anos, o CEO da Charter alertou sobre uma crescente rebelião dos consumidores contra as altas taxas de TV paga, especialmente o preço elevado da cobertura esportiva que muitos consumidores nunca assistem. As contas mensais de TV a cabo hoje têm uma média de cerca de US$ 126, de acordo com a Bloomberg Intelligence. Winfrey pediu às principais empresas de mídia, como a Disney, que permitissem à Charter agrupar canais de maneiras que reduzissem a perda de espectadores para serviços de streaming.

“Ainda não é fácil criar pacotes pequenos e atraentes, e não interessa às grandes emissoras permitir que isso aconteça”, disse Winfrey.

Disputas financeiras entre empresas de mídia e seus parceiros de cabo não são novidade, e os consumidores têm sofrido rotineiramente com bloqueios. Os clientes da DirecTV, por exemplo, não conseguem ver as estações de propriedade da Nexstar Media Group Inc. há dois meses, perdendo programas da Fox, CBS e NBC.

Mas a briga entre a Charter e a Disney parece maior. As perdas de assinantes de TV a cabo aceleraram nos últimos anos, com a indústria agora com cerca de 70 milhões de clientes, em comparação com mais de 100 milhões no auge.

Isso levou a Disney e seu CEO, Bob Iger, a repensarem o compromisso de longo prazo da empresa com a programação tradicional de TV a cabo e aberta.

Iger deixou isso claro em uma conferência de executivos de mídia e tecnologia em Sun Valley, Idaho, em julho. Ele disse que a Disney estava explorando opções para contornar os provedores de TV a cabo e vender a ESPN diretamente aos consumidores, possivelmente por meio de uma parceria. Ele também afirmou que as redes de TV tradicionais podem não ser um ativo fundamental e levantou a possibilidade de vender a ABC e os canais a cabo não esportivos da empresa.

A Disney tem investido pesadamente em seus próprios serviços de streaming direto ao consumidor – Disney+, ESPN+ e Hulu – tornando-os uma alternativa para seu vasto catálogo de entretenimento.

Winfrey, que atuou na Europa no início de sua carreira, onde os clientes com mais frequência pagam por pacotes separados de programação esportiva, parece ter se preparado para um confronto com a Disney. Tanto a Charter quanto a líder do setor, Comcast Corp., recentemente lançaram pacotes de TV a cabo de baixo custo que têm menos canais do que as assinaturas padrão e são os primeiros na indústria a não incluir a ESPN da Disney.

A partir deste mês, a Charter oferecerá dois níveis de pacotes de TV. Um, chamado Spectrum Select Plus, oferece uma extensa programação esportiva, incluindo redes esportivas regionais locais. O outro, chamado Spectrum Select Signature, exclui esportes. A Charter também planeja lançar um serviço de streaming para seus clientes que inclui redes esportivas regionais como uma alternativa à oferta de TV a cabo.

A Disney está pedindo aumentos nas taxas de assinantes, cerca de US$ 2,2 bilhões, que recebe anualmente da Charter. A Charter quer que a Disney reduza o número mínimo de assinantes que precisa pagar, para que possa oferecer mais pacotes sem esportes.

A Charter também está pedindo à Disney que permita oferecer serviços de streaming como Disney+ e Hulu gratuitamente aos seus clientes de TV a cabo premium, argumentando que grande parte desse conteúdo foi criado para telespectadores tradicionais, de acordo com pessoas familiarizadas com as discussões que pediram para não serem identificadas. Para os consumidores que usam a Charter apenas para acesso à internet, a empresa deseja oferecer os serviços de streaming da Disney sob um acordo de compartilhamento de receita.

O relógio está correndo. De um lado, a Disney está procurando uma nova estratégia de vídeo que poderia incluir a oferta da ESPN por meio de um serviço de assinatura online. Também está lidando com uma interrupção na produção de filmes e programas de TV devido à greve de atores e roteiristas de Hollywood.

Do lado da Charter, os assinantes de TV acordaram na sexta-feira incapazes de assistir a canais populares como ABC ou ESPN. Em breve, eles poderão enfrentar um apagão de jogos de futebol à medida que as temporadas universitária e da NFL começarem.

“A realidade é que o cenário de mídia e distribuição tem se preparado para este momento há muitos anos”, escreveu o analista Craig Moffett, da MoffettNathanson Research, em uma nota de pesquisa. “Está se tornando mais claro do que nunca que não há volta. Os botes salva-vidas já foram queimados.”

    — Com a assistência de Gerry Smith